UMA LEITURA ASSOMBRADA E DIVERTIDA
Assim que comecei a
ler o livro de Rogério Corrêa, Histórias do Além (assombrações, visagens, experiências sobrenaturais,
tesouros, ...), imediatamente me
veio à lembrança Dona Cenira, uma vizinha nossa, de minha infância em
Palmares─Pernambuco, que à noite, sentada numa cadeira na calçada, costumava
nos contar "Histórias de Trancoso"— era assim que se denominavam os
"causos" do além naquele tempo.
Para nós outros, os
meninos vadios e andejos que ficávamos sentados no meio-fio, coladas uns aos
outros, tremendo muito — não de frio, pois o calor era imenso na Mata Sul
pernambucana, mas tremendo de medo —, foram momentos de intensa magia, que ficaram
em nossas lembranças para sempre.
Lembrei-me também de
Seu Amaro, um viúvo surdo que conversava com sua falecida esposa todos as
noites, falando alto, aos gritos, num diálogo que era escutado pelos vizinhos.
Nós morávamos em frente à casa dele.
— Tá cum saudades de Amaro? — perguntava ele
em voz alta, trancado na sala, com as luzes apagadas.
E ele mesmo respondia
de imediato, com um grito triunfante:
— Tô!!!
Na verdade, os
vizinhos só ouviam a voz de Seu Amaro, mas eu ouvia a resposta da morta como se
fosse mesmo ela confirmando a pergunta do marido.
Os títulos das
crônicas deste livro de Rogério Corrêa casam-se admiravelmente com o fantástico
contido no título deste livro que é Histórias
do Além, e cito alguns deles: Almas Perdidas, Ponte das Almas
Perdidas, A Visão de uma Falecida, Baile das Almas, O Defunto que Saiu do
Caixão. E por aí vai. O
subtítulo é um resumo da intrigante leitura em que o leitor irá mergulhar: Assombrações,
Experiências Sobrenaturais, visagens, tesouros...
Em Palmares, quem passava
pela rua do cemitério após a meia-noite, ouvia perfeitamente a voz de um
defunto pedindo reza. A história do ente fantástico Pé-de-Espeto e os relatos
dos pescadores que viam almas quando jogavam suas tarrafas nas águas do Rio Una
eram partes integrantes do imaginário das crianças daquela terra.
De modo que a leitura
de Histórias do além foi para mim uma volta prazerosa ao irrealismo
assombroso de minha infância. Um irrealismo tão real que permaneceu para sempre
em minha cabeça, me dando sustos até os dias de hoje.
Na crônica "O
Dia da Própria Morte", Rogério narra o incrível telefonema de um pai
para sua filha, avisando-a de que viesse visitá-lo a tempo, pois ele iria
morrer "na próxima quarta-feira". E o pai não estava caduco e
aparentava gozar de boa saúde!...
Misturando
assombração com hilaridade temos uma crônica com o título de "Região
conhecida como Caga-Fogo". Não pude deixar de rir lembrando-me do
besouro caga-fogo, abundante na paisagem dos meus tempos de criança.
O livro, revela o
autor, é fruto de pesquisas feitas durante alguns anos, além de entrevistas com
várias pessoas, sobretudo do interior de Minas Gerais e Goiás. Ou seja, tudo
passa na verdade!
"Dicoque"
(presumo que a palavra seja derivada da expressão "de cócoras") é,
certamente o sapo cururu nordestino. Na crônica "Guardião da botija de ouro", revejo uma das
palavras mágicas que povoaram a minha infância, a "botija", símbolo
de fartura e de riqueza.
Quem encontrava uma,
era assim como quem acerta hoje um gordo prêmio da loteria. Lembro-me de muitas
histórias dos caçadores de tesouros que almejavam encontrar fortunas cavando as
margens lamacentas do Rio Una para encontrar uma botija.
A crônica que fecha o
livro, intitulada "O que é do homem o bicho não come", envolve
a natureza viva, homens e animais, e a natureza bruta, pedras preciosas, numa
simbiose perfeita para encerrar com chave de ouro esta coletânea de maravilhas! Uma leitura que é, a um só tempo, assombrosa
e divertida. São cinco capítulos de encantamentos, fantasmagorias e mágicos
momentos.
Recomendo com muito
entusiasmo.
Sucesso aos dois: à
obra e ao seu autor!
Luiz Berto Filho é escritor
pernambucano
Editor do Jornal da Besta Fubana
www.luizberto.com
Mais um lançamento pelo selo do Instituto/Editora ICEIB. Acesse um dos links abaixo e conheça algumas de nossas obras: